quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Polícia Federal apreende tela que era negociada por R$ 100 milhões em apartamento em Botafogo (Postado por Lucas Pinheiro)

RIO - No dia 24 de outubro, o oficial de Justiça aposentado Juarez Padilha, 82 anos, colocou um anúncio no GLOBO para vender uma das telas de sua coleção de arte. No texto do classificado, escreveu: “Quadro histórico, mestre Rubens, Peter Paul (1577-1640). Pintado em 1599, com 21 anos, tela a óleo 69x99cm”. O espaço trazia, ainda, um e-mail, um telefone e uma pequena foto da obra em questão.


Anteontem, a Polícia Federal (PF) entrou em seu apartamento — um três quartos na Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo — com um mandado de busca e apreensão motivado pelo anúncio. De lá, saiu não só com o suposto Rubens, que Padilha, dias antes, havia tentado vender por R$ 100 milhões a um agente federal disfarçado, como também com um carrinho de supermercado repleto de peças suspeitas, segundo a PF. A polícia investiga Padilha pelos crimes de receptação (de bens ilícitos) e estelionato.

Entre as obras que lotaram as viaturas policiais, estavam um cartão-postal atribuído a Pierre-Auguste Renoir (1841-1919) e dois violinos que o aposentado jura serem da marca Stradivarius, a mais famosa do mundo.

Em entrevista ao GLOBO, Padilha contesta a atuação dos agentes federais e diz ter recibos de compra de tudo o que foi recolhido e levado à Superintendência da PF no Rio para perícia — só ela dirá se as peças são falsas ou não. A PF, por sua vez, comemora a ação e manda um recado:

— Batizamos esta operação de Aviso Geral para deixar claro que a Polícia Federal está de olho nos crimes que envolvem obras de arte — diz o delegado Fábio Scliar, titular da Delegacia de Repressão a Crimes Contra o Meio Ambiente e o Patrimônio Histórico.

Visita à paisana

Há cerca de 15 dias, Scliar e um agente foram ao apartamento de Padilha à paisana. Fazendo-se passar por representantes de um colecionador interessado em comprar peças que poderiam ser facilmente transformadas em dinheiro no exterior (lavagem de dinheiro), travaram uma negociação.

— Pelo suposto Rubens, ele pediu R$ 100 milhões. Oferecemos R$ 10 milhões em dinheiro, e ele topou — conta Scliar. — Depois, mostrou outras peças. Por cada violino, pediu R$ 3,5 milhões.

Segundo os policiais, o apartamento do investigado, que até 1992 era oficial de Justiça avaliador da Justiça Federal no Rio, é um espaço “abarrotado de peças históricas”. Há pinturas, esculturas, centenas de bibelôs e até móveis que o ex-oficial de Justiça diz serem da época do rei francês Luís XV (1710-1774).

Para dar visibilidade a seu acervo, explicam os policiais, Padilha postava imagens e textos num blog — endereço que, até quarta, continuava ativo.

Como ferramenta de venda de seu suposto Rubens, o aposentado apresentava aos possíveis compradores (e foram dois nos últimos dois meses, segundo a PF) um laudo atribuído ao americano NSF Arizona AMS Laboratory, com sede em Tucson, nos EUA. O documento é um suposto exame com carbono 14 que informa que a tela teria sido pintada entre 1520 e 1960. Diante da imprecisão, a polícia duvida da veracidade do laudo. Procurado pela reportagem, o diretor do laboratório, A.J. Timothy Jull, alegou ética profissional para não comentar o assunto.

— A única coleção pública que tem obras de Rubens no Brasil é a do Masp — diz José Nascimento, presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). — E não tenho notícias de obras do pintor em coleções particulares.

Para especialistas estrangeiros que viram fotos do “Rubens de Botafogo”, pincelada, paleta e composição em nada remetem ao estilo do holandês. A tela parece feita por um “pintor menor”, com características do século XIX.

Diante de fotos dos violinos, Saulo Barreto, um dos luthiers mais conhecidos do país, não hesita:

— O verniz e a etiqueta não correspondem aos de um original. Pelo que se pode ver, o trabalho é grosseiro. (Colaborou Catharina Wrede)

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